Às vezes acho que faltam alguns "heróis" como Yustrich. Ao rever todo o caso Montillo, fiquei pensando se o "homão" ainda estivesse aqui entre nós... Ia sobrar tapa pra tudo quanto é lado!
Simplesmente Yustrich
Dorival Knippel ou simplesmente Yustrich nasceu em Corumbá Mato Grosso do Sul em 28 de novembro de 1917. Dorival Knippel herdou esse sobrenome porque por parte de pai descendia de avós alemães. E aos 6 meses de idade, apenas, foi trazido pelos pais, ao Rio de Janeiro e entregue aos seus tios, que passaram a criá-lo e educá-lo. Ao atingir os 7 anos, o menino Dorival já era órfão de pai e mãe. Começou a estudar no colégio José de Alencar, no Largo do Machado, onde completou o primário. Depois fêz os dois primeiros anos ginasiais, no Ginásio Lafaiete e os restantes como interno do Instituto João Alfredo.Dorival Knippel fez carreira no futebol carioca como goleiro do Flamengo e Vasco. O apelido de Yustrich ganhou quando ainda jogava no Flamengo na década de 1930, dado a sua semelhança com o goleiro do Boca Jrs Juan Elias Yustrich. Yustrich desde essa época tinha a fama de temperamental. No Rio ainda jogou no Vasco onde encerrou a sua carreira de jogador.
Tinha a fama de carrasco com os jogadores, grosseiro com a imprensa e sedutor com a torcida. Com os amigos chegava a ser até um sujeito afável, que se divertia cuidando das roseiras e de vários cachorros da raça dálmata e labrador em seu sítio em Vespasiano-MG. Mas também era adepto do box, luta greco-romana e vale-tudo. Yustrich freqüentava o extinto Clube Paysandu especializado em lutas de várias modalidades. (localizado na antiga Feira de Amostras) onde é hoje a rodoviária de BH
Yustrich e seus cachorros. Compania em seu Sítio em Vespasiano.
No túnel era mais feroz que bedel de internato. Acreditava que jogador de futebol deveria levar a vida de escoteiro: ter comportamento exemplar e fazer uma boa ação por dia. Sob seu comando, não permitia que os jogadores deixassem a barba mal feita, usassem os cabelos compridos ou fumassem. Além de não tolerar os atrasos e a falta de empenho nos treinos. Yustrich inovou em seu tempo, exigia do Clube boas acomodações para os atletas. Uma vez quando assumiu o comando técnico do Galo, foi à concentração no estádio de Lourdes recolheu colchoes e reuniu tudo o que estava quebrado e jogou fora e exigiu tudo novo. Yustrich sempre ao fim de cada treino fazia questão de uma mesa farta a disposição de seus atletas. Caso contrário partia para briga com a diretoria. Mas mesmo com todo esse temperamento explosivo Yustrich sempre colocou as equipes que dirigiu nas primeiras colocações e era sempre lembrado com um técnico capaz de acabar com qualquer ambiente de indisciplina, como uma vez declarou:
" Nunca ninguém me convidou para comer goiabada com catupiri. Só me convidam para comer jiló. Quando um time está por baixo, perdendo de todo mundo, é que me chamam. Aí eu chego, conserto tudo. E quando as coisas já estão nos eixos outra vez, eles me mandam embora. Nunca me chamaram para dirigir o Santos dos bons tempos, por exemplo. Só me chamam par lavar roupa suja. E sou uma lavadeira cara."
Outras declarações de Yustrich:
"Sou um concertador de times em crise."
" A impresa perturba o meu trabalho honesto."
"O que o futebol tem de ruim é o fato de ser guarida de gente que busca popularidade, sem ter nada para dar em troca. Assim, o futebol vem se trasformando em meio onde muitas pessoas encontram formas e maneiras de se revelarem."
"O futebol é uma escola que ensina a viver. Fortaleceu-me o espírito como prática de vida. Deu-me grandes amizades e criou um mundo de inimigos desconhecidos, porque não se pode agradar a gregos e troianos. O futebol é uma escola onde a disciplina tem de ser vivida como base."
Em suas passagens pelo Atlético colecionou amigos e grandes inimizades. Também era chamado de "Homão" devido aos seus 1,92 de altura e corpo de lutador peso-pesado de box. Yustrich chegou ao Atlético em 1952 e logo foi campeão estadual. Em 1953, entrou em atrito com Zé do Monte e Lucas Miranda. Dois jogadores de comportamento irretocável. No inicio daquele ano o Galo foi a Belém PA, Lucas Miranda não pode viajar, pois conciliava o Atlético com um emprego na Prefeitura de Belo Horizonte. Lucas pediu dispensa aos diretores do Galo que imediatamente aceitaram as suas justificativas, porém, Yustrich não gostou.
Após a volta a Belo Horizonte, Yustrich queria tirar suas diferenças com Lucas Miranda e durante a preleção antes do jogo amistoso contra os argentinos do Chacaritas Jrs entrou em luta corporal com seu comandado. Como a aceitação do treinador já não era das melhores o clima ficou insustentável. Dias depois, todo elenco atleticano se dirigiu a diretoria para exigir a saída de Yustrich. Sem clima para ficar, Yustrich deixou o comando técnico do Galo indo treinar o Porto de Portugal onde também foi campeão. Quando saiu do Porto também foi por entrar em atrito com seus comandados.
Yustrich brigou no Porto com uma de suas maiores estrelas. Sem ambiente entre os jogadores deixou o comanto técnico da equipe mesmo acabando com um jujum de 16 anos do FC do Porto.
De volta ao Brasil, treinou o Vasco antes de retornar ao Galo na temporada de 1960. Em 1964, foi campeão mineiro com o modesto Siderurgica de Sabará. Na partida decisiva do campeonato, o atacante Noventa fraturou o braço. No intervado do jogo Noventa pediu substituição, Yustrich não teve dúvida. Tacou-lhe um sopapo na cara e ordenou: " Você vai é para o jogo seu safado!" No segundo tempo Noventa mesmo com o braço fraturado marcou o gol do título do Siderurgica de 64 na vitória sobre o América por 3x1.
Do Siderurgica foi para o Vila Nova, de Nova Lima, onde jogava um meio-campista de apelido “Quelé”. Yustrich reclamava do jogador por relaxar na marcação: “Pô, rapaz, você domina fácil a bola, sabe driblar, passa bem, mas não combate. Isso é ruim. É preciso voltar para marcar. Por que não faz isso?” E o jogador respondeu: “Ah, seu Yustrich. O senhor acha que dominando bem a bola, driblando bem, passando certo e dando combate, como senhor deseja, eu estaria aqui nesse timeco?”
Anos depois, mais precisamente em 1968, Yustrich voltou a treinar o Atlético. Nessa passagem encontrou um jogador, alto, forte, mas que não tinha qualquer intimidade com a bola. Yustrick pacientemente ensinou o bê-a-bá da bola a esse jovem atleta impondo-lhe uma dura rotina de treinamentos com 150 cabeçadas, e pelo menos duzentos chutes a gol por dia. O jovem atleta seguiu as ordens do técnico integralmente, chegava duas horas antes de todos os outros e saia duas horas depois. Aos poucos Yustrich o lançava durantes os jogos e seu pupilo começou a fazer gols. Mais tarde tornou-se um dos maiores artilheiros do mundo, seu nome era Dario José dos Santos, o Rei Dadá!
Nessa mesma passagem Yustrich entrou em atrito com um uruguaio, que também tinha a fama de temperamental. Esse uruguaio se chamava Cinconegui. Em 1968, o Galo foi a Goiânia para um amistoso. Como os transportes naquela época eram deficientes, o time viajou de avião até Brasília, de onde prosseguiria de ônibous. A viagem atrasou, e Yustrich teve uma de suas idéias ditatoriais e queria que o time treinasse em Brasília antes de prosseguir. Cinconegui não gostou. Sentado em um banco no ônibus dirigiu ao treinador com essas palavras:
“ Ficou doido? Agente vai viajar e você quer ainda treinar?”
Yustrich não deixou por menos e quis resolver a questão na base do tapa. E ainda disse: “Vai treinar sim seu gringo safado!” Cinconegui não se mexeu, e enfiou a mão em uma sacola junto a seu corpo e tirou um revolver engatilhado. Quando viu o 38, Yustrich recuou e disse: “Aqui você não joga mais! Aqui você não joga mais!” Os jogadores ficaram do lado do jogador e com o desgaste do fato acabou saindo do Galo e deixando sua vaga para Telê Santana.
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Em 1970, Yustrich estva de olho na vaga de João Saldanha, não perdia a chance de fazer pesadas criticas ao trabalho o então técnico da Seleção. Saldanha, quis resolver o problema na base do tiro, uma vez que no tapa não tinha condição de encarar o homão. Depois desse epsódio Salanha que já não era bem visto pelos militares por sua posição política e a declaraçaõ que Presidente deve escalar ministério e não seleção de futebol, ficou na berlinda. O Empate da Seleção com o modesto Bangu-RJ foi o estopim para sua queda no comando técnico da Seleção Brasileira.
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Em outra briga que entrou para história do futebel era sua rixa que tinha com João Saldanha. Outro desafeto que tentou encarar Yustrich com um revolver na cintura. Em 1969, na preparação da seleção brasileira para a copa de 1970, então dirigida por João Saldanha, foi programada uma partida contra o Atlético no Estádio do Mineirão. Por uma exigência da CBD e do próprio Saldanha o Galo entrou em campo com a camisa vermelha da Seleção Mineira.O Galo acabou vencendo a Seleção Brasileira por 2x1. Ao final da partida, Yustrich obrigou seus jogadores a darem a volta olímpica no gramado, usando a camisa alvinegra do Atlético que vestiam por baixo da vermelha da Seleção de Minas. O Mineirão quase veio abaixo. Isto lhe valeu a inimizade de João Saldanha. Em 1970, após receber várias criticas de Yustrich, Saldanha pegou seu 38 e foi até a concentração do Flamengo na Gávea (clube que Yustrich treinava em 1970) mas como Saldanha não encontrou Yustrich, a turma do "deixa disso" contornou a situação.
Yustrich se tornou técnico da seleção brasileira por uma única partida e de uma maneira peculiar. Em dezembro de 1968, o Atlético foi convidado a representar o Brasil num amistoso contra a antiga Iugoslávia. Vestindo a camiseta canarinho, o Atlético venceu por 3x2 depois de estar perdendo por 0X2, em uma virada emocionante comanada por Yustrich.
Depois do Flamengo, treinou o Cruzeiro(72) Corinthians(74) e o Coritiba(76). Em 1977, estava novamente no futebol mineiro, desta feita no Cruzeiro, encontrou um grupo de jogadores quase todos cabeludos, alguns barbudos e outros com penteado estilo black-power. Não se conteve e perguntou: “esse é um time de rock?” No Cruzeiro em 77 já de início, tomou uma medida que desagradou aos jogadores: proibiu o jogo de sinuca na concentração. Mas naquele ano o Cruzeiro sagrou-se campeão mineiro.
Do Cruzeiro, Yustrich foi dispensado por conta de uma discussão em torno de um fato banal. Após um jogo em Araxá, um jogador deu a camisa para um garoto que invadira o gramado. Yustrich mandou o roupeiro buscar a peça. O presidente do clube não permitiu. Esse fato gerou o desejo de demitir o Homão do Cruzeiro, mas ninguém teve coragem de demiti-lo pessoalmente. Foi feita então, uma carta de demissão. A responsabilidade de entregar a correspondência ficou a cargo do supervisor Robson José. Ele viajou até o sítio do treinador, em Vespasiano. Há quem diga que o supervisor, temendo a reação explosiva do Homão” jogou a carta por debaixo da porta, tocou a campainha e saiu correndo.
Yustrich encerrou no Cruzeiro sua carreira de treinador. Teve um programa de rádio que não durou muito. Após uma cirurgia de ponte-de-safena, retirou-se para o mais completo anonimato em seu sítio em Vespasiano. Durante esse período de anonimato, administrou um estacionamento de sua propriedade na Avenida do Contorno próximo ao viaduto Santa Tereza, onde era sempre visto atendendo seus fãs sempre com muita atenção e cordialidade. Este quase anonimato é a razão de serem hoje incompletas e distorcidas as informações sobre ele. Alguns cronistas esportivos chegam a atribuir a ele a nacionalidade argentina, numa evidente confusão com seu homônimo do Boca Juniors, também já falecido. Yustrick faleceu em 15 de fevereiro de 1990.
Yustrich no Morumbi em 1974
Yustrich em uma de suas várias confusões no Gramado do Morumbi em 1974. Ao Seu lado Zé Maria e Dr Osmar de Oliveira.